Savanna Aires Soares
Segundo o
velho Google, essa frase pertence à Carl Sagan, cientista que dedicou seus
estudos à Astronomia, sendo entusiasta da chamada Exobiologia, ciência que se
volta para a investigação da vida fora da Terra. Não sou, nem de longe, uma profunda
conhecedora das suas obras, o que me instigou a buscar informações sobre ele
foi um amigo, quando me revelava a sua admiração por Sagan. Dias depois, ainda
pesquisando um pouco mais, me deparei com a frase acima.
E é exatamente
isso: um livro é capaz de fazer magia na vida das pessoas. Feitiço que pode nos
lançar para a realidade de forma oculta e inimaginável.
Nesse momento,
consigo ter a verdadeira consciência de dois que fizeram/fazem profunda
diferença na minha, mas quero dedicar esta postagem a um deles, apenas.
O livro a que
me refiro foi um presente do meu pai e veio acompanhado de outros da mesma
temática, porém, com abordagens distintas. Chama-se “Alfabetização Ecológica: A educação das crianças para um mundo
sustentável” (“Ecological Literacy”),
escrito por Fritjof Capra e colaboradores. (Dispenso aqui os
títulos e obras dos autores, acreditando ser de extrema irrelevância, pois além
de tais informações estarem facilmente disponíveis na internet, não são elas
que atribuem significado a este livro).
Já
pelo título fiquei empolgada, pois como havia me tornado integrante de uma ONG
há poucos meses e o foco da instituição é promover a Educação Ambiental de
crianças e adolescentes, enxerguei nesse livro a oportunidade de conhecer
melhor a temática e assim, contribuir de maneira mais responsável com os
projetos da equipe. (Um outro detalhe é que as folhas são recicladas, e como já
vinha adotando o uso das mesmas no meu cotidiano, senti como se o livro fosse
familiar. Hehehe).
Nas páginas do
livro, reúnem-se as preciosas experiências de até então 10 anos de uma fundação
localizada na Califórnia: o Centro de Eco Alfabetização, que desde 1995 realiza
e apoia projetos de educação para a sustentabilidade. Os responsáveis pelos
relatos são teóricos, ativistas e educadores, que por meio de suas vivências,
nos orientam sobre como alcançar a tão desejada vida sustentável e, sobretudo,
em que esse hábito consiste.
Até então, muito já tinha lido, escutado e até conversado a respeito da ‘sustentabilidade’
e apesar de ter conhecimento do seu propósito, sentia falta de práticas e
relatos que fizessem jus ao seu verdadeiro significado. (Ações que
ultrapassassem os 3R’s, entende?). É cômodo e ao mesmo passo arriscado disseminar essas práticas que “estão em
alta”, sem compreender a importância de se estabelecer outras relações, muito
mais profundas e duradouras, com o espaço onde se vive.
Logo
no Prefácio, ‘Como a natureza sustenta a Teia da Vida’, Capra comenta do uso
frequente do termo “SUSTENTÁVEL” e atenta: “essa definição não diz nada com
respeito a como construir uma comunidade sustentável. Precisamos de uma
definição operacional do que seja a sustentabilidade ecológica”. E é utilizando
dos princípios básicos da Ecologia, que ele nos mostra as relações pelas quais
a natureza se sustenta e o quanto podemos aprender com ela. “A educação para
uma vida sustentável estimula tanto o entendimento intelectual da ecologia como
cria vínculos emocionais com a natureza”.
Para minha
surpresa e alegria, as primeiras páginas do livro já me aproximaram consideravelmente
da famosa desconhecida Sustentabilidade, fazendo-me enxergar a sua inerência na
vida do planeta. (Engraçado, de uns tempos pra cá, ela ser tão almejada, quando
na verdade sempre existiu, mesmo que silenciosamente. Então, me pego fazendo
algumas perguntas: Em qual tempo a ignoramos? Seria essa ignorância resultado da falta de percepção de muitos à sua existência? Interrogações pairam no ar...)
Essa aproximação foi de grande estímulo para persistir
na leitura daquelas páginas que já faziam discreto feitiço na minha forma de
enxergar a vida.
Outro momento
que acho bastante pertinente é quando Capra, em seu ensaio ‘Falando a linguagem
da natureza: Princípios da sustentabilidade’, atenta: "não existe nenhum
currículo de sustentabilidade do tipo “tamanho único que sirva para todos”’.
Ele expressa esse pensamento ao abordar um dos princípios da Ecologia: a
diversidade. Trazendo este conceito para
a realidade humana, são inúmeras as possibilidades de relações com as quais nos
deparamos e também estabelecemos durante nossa vida, cada qual com suas particularidades.
E essa diversidade jamais deve ser ignorada, sobretudo quando se pretende
elaborar um projeto, seja ele em qual área for.
Para se definir o plano de ação de qualquer
trabalho é indispensável conhecer a realidade do ambiente onde será executado, para
que seja possível atender ao máximo às reais necessidades do grupo alvo. E talvez, ainda
mais importante que isso, é ter em mente que o plano traçado está
susceptível a vários ajustes ao longo de seu desenvolvimento. E não tem outro caminho a
seguir quando se deseja colher frutos duradouros.
Ao passo que
escrevo essas linhas, recordo-me de tantos outros momentos significativos do
livro, que não se restringem somente à pratica educacional em si, embora
também auxiliem nesse campo. Mas a verdade é que não posso concluir esse texto sem
antes dividir a magia de um capítulo especialíssimo, que talvez tenha sido o de maior importância para reanimar a minha consciência cidadã.
O ensaio é
escrito por David W. Orr, um dos diretores do Centro desde a sua fundação, e recebe o título de 'Lugar e pedagogia’. A
vontade inicial é de transcrevê-lo, linha por linha, pois cada uma delas abriga
ensinamentos e reflexões que talvez não estejam presentes em nenhum outro
livro. Mas, vai que algum(a) curioso(a) seja enfeitiçado(a) e deseje um dia
compartilhar dessa mesma leitura, né? Melhor deixá-lo reservado!
Os primeiros
parágrafos do texto são dedicados à íntima relação entre o Homem Thoreau e o Lago
Walden, tema de uma obra publicada primeiramente no ano de 1854 com o título Walden ou A vida nos bosques. Alimentado
pela busca da essência da vida, Thoreau instala-se à beira de um lago, que não
seria somente mais um elemento da paisagem, mas o lugar onde Thoreau fincou
suas raízes para vivenciar as mais orgânicas e inesperadas experiências. Como
David relata: “Thoreau viveu o tema de
seu livro. ‘Walden’ é mais do que um diário sobre o que ele pensava; é um
registro do que ele fazia e das experiências que tinha”. E ainda: "Em última instância, o objeto de estudo
de Thoreau era o próprio Thoreau; tendo como propósito a sua integridade; como
meio, o Lago Walden; e como metodologia, a simplificação.” (Fantástica essa
definição!).
A partir desta
referência e de outras que são abordadas no ensaio, Orr atenta para o lugar
como importante instrumento educacional, uma vez que possibilita a integração
das mais diversas áreas do conhecimento e estimula a prática e articulação
desses saberes. No ensaio seguinte, inclusive, Orr expõe: “As coisas mais profundamente arraigadas em nós são formadas pela
combinação da experiência de fazer com a prática da reflexão e da articulação”,
citação esta até já utilizada por mim nesse blog, quando registro a minha
experiência como voluntária no Projeto Tartarugas Urbanas (PTU).
Mais
importante até que possibilitar a conexão dos mais variados saberes, o estudo do
lugar de onde vivemos é essencial para nos transpor do posto de um tímido
observador daquele espaço para o de um indivíduo enraizado, integrado com as
condições oferecidas e preocupado em preservá-lo. “A nossa vida é vivida em
meio a expressões arquitetônicas de deslocamento: os centros comerciais, prédios
de apartamentos, luzes de neón, autopistas, torres de vidro e desenvolvimento
homogeinizado – nenhum dos quais ajuda a fortalecer o sentimento de enraizamento, de responsabilidade e pertencimento.”
(grifos meus).
Como já externei
em linhas acima, o ensaio de David é repleto de passagens reflexivas, que nos
levam a reavaliar a nossa posição diante do lugar onde vivemos. Antes da
leitura desse ensaio, eu já era sim uma pessoa preocupada em manter o bem estar
do ambiente em que moro, não limitado apenas à minha casa, rua ou bairro, mas
de todos pelos quais passava. E não era à toa que atitudes de alguns indivíduos
já me causavam indignação, por expressarem enorme desrespeito ao lugar onde se
encontravam. Mas, sabe quando se é vítima da tal ‘injeção de realidade’? Foi
isso. Orr me fez enxergar profundamente a importância de se entregar ao lugar
que se habita (diferente de ‘residir’, como ele mesmo coloca em outro momento:
“O residente é um ocupante temporário, que finca poucas raízes e investe pouco,
conhece pouco e talvez só se importe com o lugar na medida da sua capacidade de
lhe oferecer gratificação imediata.”).
Acredito que o entendimento e a valorização do
Lugar são cruciais para despertar nas pessoas o verdadeiro sentido de
preservação, e é este sentimento que impulsiona o respeito e a busca da
integridade de muitos outros ambientes, até mesmo daqueles pelos quais você
nunca tenha passado. Hoje, sinto meus poros muito mais abertos à aprendizagem
do lugar, do que ele pode me revelar e, sobretudo, do que eu posso fazer em
prol de seu resguardo.
(Já escrevi
muito!!!!). Mas acreditem, há muito mais o que registrar e discutir, não apenas
sobre este maravilhoso ensaio de David, mas dos muitos relatos presentes em
todo este livro, que tanto ampliou meus horizontes, ajudando-me a enxergar as
mínimas e não menos importantes aprendizagens que a vida pode nos proporcionar.
Despeço-me desejando a você, leitor, a oportunidade de ser enfeitiçado por
livros mágicos e que estes sejam fonte de inspiração para a sua caminhada.
“A mera esperteza é muito superestimada e não é, como em geral se acredita, um sinônimo perfeito de inteligência. Mas a generosidade é uma espécie de inteligência a longo prazo.” (David W. Orr)